Judiciário e democracia: a prisão política de Lula, por Wagner Sousa

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A confirmação da condenação do ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva pelo tribunal de segunda instância, neste 24 de janeiro de 2018, iniciou, de fato, o ano eleitoral no Brasil. A já aguardada sentença condenatória deu-se pelo placar de 3 votos pela condenação e nenhum pela absolvição no colegiado de três juízes.  Uma batalha judicial ocorrerá nos próximos meses. A eleição se dará em outubro.  A liberdade de Lula e o direito a concorrer à presidência da república estarão em jogo.  

O legislativo brasileiro aprovou, em 2010, legislação que prevê proibição de candidatura de individuo condenado em segunda instância, caso de Lula. No entanto, o seu partido político, o Partido dos Trabalhadores, lançou, um dia após a decisão do tribunal de apelação, sua pré-candidatura à Presidência da República. Uma questão relevante diz respeito à jurisprudência da suprema corte brasileira determinando que o cumprimento da pena de prisão possa se dar após decisão de segunda instância. A tendência da corte é rever esta decisão, embora também haja bastante controvérsia e divisão a respeito. Sem esta revisão, após recursos que ainda cabem na segunda instância (apenas de esclarecimento de dúvidas sobre o conteúdo e não sobre o mérito) Lula terá a sua prisão determinada. Duas instâncias superiores, o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal ainda devem analisar o caso.

A condenação de Lula tem um significado que transcende a questão penal relacionada à sua pessoa física e é eminentemente política. Lula figura como líder em todas as pesquisas de intenção de voto, em algumas, inclusive, vencendo o pleito de dois turnos, já no primeiro turno. O fato do eleitorado brasileiro ter sonegado o seu direito de votar no candidato com mais apoio é um problema para a jovem democracia brasileira, de pouco mais de 30 anos. Isto somado a um impeachment de bases legais frágeis em 2016 e aos impactos da Operação Lava Jato sobre o sistema político (abrindo espaço para um possível outsider), especialmente sobre o PT mas também sobre outros partidos como o MDB e o PSDB. O ex-presidente, como já mencionado em texto anterior, foi acusado de possuir imóvel em praia do litoral brasileiro que seria produto de acordo escuso com empreiteira (OAS) em troca de favorecimento em contratos da estatal petrolífera Petrobrás. O juiz de primeira instância e os juízes de segunda instância o condenaram. As críticas a esta decisão estão baseadas tanto na “criatividade” (e atribuo a esta palavra conotação bastante negativa) dos juízes para imputarem a propriedade a Lula quanto no histórico da Operação Lava Jato, suas arbitrariedades e seu partidarismo. Não se provou que o imóvel pertenceria a Lula, que houvesse ligação entre o imóvel e a participação da OAS em obras na Petrobrás e figuras jurídicas estranhas ao direito, ao menos o direito brasileiro, como “propriedade atribuída” e “ato de ofício intedeterminado” embasaram as decisões. Uma interpretação deturpada da “Teoria do Domínio do Fato” embasou as decisões. Segundo o seu criador, o jurista alemão Claus Roxin, não basta supor que o superior hierárquico tinha ciência do que ocorria. É necessário prová-lo. Desde o julgamento, em 2012, do chamado mensalão (escândalo de caixa dois e alegada compra de votos no congresso brasileiro, que foi denunciado em 2005) a suprema corte brasileira tem feito esta “interpretação criativa” da Teoria do Domínio do Fato. O tribunal de segunda instância que julgou Lula se valeu da mesma “criatividade”, ou seja, julgou fora dos parâmetros legais. No mesmo dia da condenação de Lula a Procuradoria da República solicitou arquivamento de ação contra o senador José Serra, do PSDB. Mas há um sério problema para a direita brasileira: até o presente momento, os conservadores não têm um candidato competitivo. Mesmo com a condenação e eventual prisão de Lula, este preserva elevado capital político e terá influência nas eleições através da indicação de outro nome. A Operação Lava Jato teve como consequência a desmoralização geral do sistema político, enredado nas contribuições ilegais de campanha e propina para enriquecimento pessoal, o que atingiu o principal partido de centro-direita, o PSDB, e seus principais líderes. O governador de São Paulo, nome do partido que deve ser candidato a presidente, não chegou aos dois dígitos nas pesquisas. O cenário se apresenta bastante instável e difícil de fazer previsões. A direita brasileira segue procurando o seu Macron. E é bastante provável que o candidato do campo conservador enfrente, mais uma vez, o candidato do PT ou outro apoiado pelo partido, no segundo turno.    

Foto: Ricardo Stuckert/ Fotos Públicas

Texto originalmente publicado em 2018.

Wagner Sousa é Doutor em Economia Política Internacional pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e Editor de América Latina.

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