A nova Constituição de Cuba, por Wagner Sousa

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Esta semana o governo de Cuba aprovou o texto completo do anteprojeto para uma nova Constituição, substituindo o documento de 1976. Com relevantes alterações nos campos econômico e social o novo texto propõe a eliminação de referências ao comunismo, o reconhecimento da propriedade privada, a criação do cargo de primeiro-ministro e a mudança no conceito de casamento, o que deve permitir a união legal entre homossexuais. A respeito da supressão do termo “comunismo” segundo o site Deutsche Welle “(…) o presidente da Assembleia Nacional, Estebán Lazo, alegou que a situação atual de Cuba e o contexto internacional são muito diferentes em comparação a 1976”. Diz ainda a liderança cubana, segundo a mesma publicação “Isto não quer dizer que renunciamos às nossas ideias, mas que em nossa visão pensamos em um país socialista, soberano, independente, próspero e sustentável.” Destaca ainda o site da emissora pública alemã que “o artigo 21 do novo texto submetido a debate também reconhece ‘outras formas de propriedade como a cooperativa, a propriedade mista e a propriedade privada’, e admite o investimento estrangeiro como ‘uma necessidade e um elemento importante do desenvolvimento’”. Mas o texto destaca o papel do Estado na economia e a primazia do Partido Comunista, conforme a DW “a empresa estatal é sujeito principal da economia como gerador da riqueza do país” e “a propriedade socialista de todo o povo é o núcleo fundamental”; sobre a organização política menciona que se “manterá o caráter socialista do sistema político e social” e o Partido Comunista de Cuba como “força dirigente superior”, ainda que fixe um mandato de dez anos para o novo cargo de presidente da República e proponha a criação do cargo de primeiro-ministro.

Cuba então propõe avançar em reformas econômicas e políticas buscando um novo modelo de desenvolvimento e uma política cubana pós Fidel e Raúl Castro. A inspiração, em grande medida, são as reformas empreendidas na China a partir de Deng Xiaoping, em 1978, em que o país adotou a economia capitalista, porém sem abdicar do controle e presença estatal. De economia planificada socialista passou-se a um capitalismo de Estado em que se combinam a iniciativa privada com as empresas estatais e o planejamento de longo prazo. Um exemplo da influência do modelo chinês é a criação das “Zonas Especiais de Desenvolvimento Econômico”, que o 6º Congresso do Partido Comunista, em abril de 2011, aprovou e visam atrair o investimento estrangeiro. O objetivo é que essas zonas, como a primeira, junto do Porto de Mariel, nas palavras do jornal oficial Granma “permitam incrementar a exportação, a substituição efetiva de importações, os projetos de alta tecnologia e desenvolvimento territorial; e que contribuam com novas fontes de emprego” (103ª diretriz). Segundo o mesmo jornal, das empresas presentes, 5 são de capital cem por cento cubano, 19 cem por cento estrangeiro, 8 empresas mistas e duas Associações Econômicas Internacionais. O investimento é de quase 1,2 bilhão de dólares e quase 5 mil empregos diretos foram gerados.

O país caribenho tem uma economia dependente da exportação de recursos naturais como níquel, minério de ferro, cobalto, açúcar, cítricos, tabaco, café e da atração de turistas (em 2017 foram 4 milhões, um recorde, segundo o Ministério do Turismo cubano). Após alguns anos de crise, no ínicio dos anos 1990, fruto do fim dos subsídios da União Soviética (de 4 a 6 bilhões de dólares anuais) o país tem crescido desde 1994 e, no ano de 2016 enfrentou a primeira queda de 0,9%, causada principalmente pelos efeitos altamente destrutivos do furacão Irma. Em 2018 a expectativa é de um crescimento em torno de 2%. Cuba chama a atenção pelo sucesso de sua indústria de biotecnologia, com capacidade de produzir drogas modernas e vacinas e que sustenta uma indústria farmacêutica que vem tendo sucesso em suas exportações. Isso é possível pelos investimentos em educação e ciência e tecnologia e pela aferição dos resultados dos gastos em pesquisa em termos de benefícios sociais que gera.

Com índices muito superiores aos vizinhos latino-americanos em educação, saúde e outros indicadores importantes como, por exemplo, acesso à água potável (91% da população) e rede de esgotos (98% da população) Cuba vai, gradativamente, empreendendo o seu esforço de se adaptar a um mundo de economia capitalista internacionalizada sem abrir mão de suas conquistas sociais e do controle estatal da economia, buscando o desenvolvimento econômico para manter e ampliar essas conquistas. E no plano político, sem abdicar do controle pelo partido único, busca uma nova institucionalidade pós-Castro, limitando o tempo de mandato do presidente da República.

Foto: Carlos Silva / El Ciudadano

Texto publicado originalmente em 2018.

Wagner Sousa é Doutor em Economia Política Internacional pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e Editor de América Latina.

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